Rico em Magnésio — Parte 1/2

Crônicas A Mais
7 min readJun 20, 2023

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Créditos: Gypsy Dog @gypsydognft

Não sou do tipo que fica nervoso facilmente.
Mas, naquele dia, foi só abrir minha caixa de e-mails para sentir meu corpo quente.
Era uma mensagem inocente, uma notificação que a fotógrafa apareceria no escritório durante a semana para atualizar o banco de dados da marca com fotos dos funcionários.
Assim que abri o correio eletrônico, resolvi que minha camiseta não era boa o suficiente. Meu perfume parecia não combinar, meu cabelo não alinhava-se de jeito algum, enfim, tudo parecia errado.
Claro que era bobagem, meu cabelo estava o mesmo se sempre: curto, alinhado, com costeletas raspadas e um pequeno topete na frente.
Será que a Fernanda gostava de caras que nem eu?
Não que eu fosse um estranho para ela. Já tínhamos trocados olhares no escritório. Mas, será que esses olhares tinham de fato sido algo de um flerte? Ou seriam apenas frutos da minha fantasia libidinosa?
Não saberia dizer com certeza.
E cada dia que ela aparecia no escritório era um dia em que eu ia trabalhar com mais vontade.
Com vários tipos de vontade.
Não quero soar como um perseguidor, mas sempre que Fernanda passava pela minha mesa, eu sentia seu aroma levemente alcoólico invadir minhas narinas.
Era o suficiente para me deixar duro.
E quem sabe ela soubesse o efeito que ela tinha sobre mim?
Por que mais ela passaria tantas vezes ao longo do dia pelo meu corredor para encher sua garrafa de água no canto mais afastado do andar?
Só de ver ela enchendo sua garrafa já me deixava com sede.
Um dia hidrataria aqueles lábios com um beijo molhado.
E todos esses devaneios passavam como dardos em minha mente, misturando memórias e fantasias enquanto eu finalmente trocava de roupa, calçava os sapatos e partia ao trabalho.
“Tirar suas fotos, claro!”

Créditos: Gypsy Dog @gypsydognft

“Sabe aquele novo lugar da esquina?”
“Afro alguma coisa?”
Minhas colegas de trabalho falavam baixo no fundo do elevador. E lá estava eu, o terceiro passageiro.
“Esse mesmo, fui no fim de semana com meu marido.”
“E aí? É verdade o que dizem?”
Tentei não demonstrar minha curiosidade, mantendo minhas costas para elas.
“É… você não sabe o que que aconteceu quando a gente voltou pra casa.”
Um silêncio enquanto o lento elevador percorria os andares. Ela falava ainda mais baixo.
“Então… eu nem lembrava da última vez que ele fez aquilo em mim.”
“Amiga… Agora conta, né?”
“Amiga, eu gozei a noite toda.”
Não pude evitar, virei a cabeça levemente para ouvir melhor.
Silêncio.
Será que elas notaram?
“Ahm… Falo depois.”
O elevador chegou no nosso andar, e eu saí rapidamente, envergonhado demais para descobrir se elas tinham percebido que eu escutei a conversa.
“Tá passando bem, Rico? Você está meio vermelho”
Quase esbarrei na fotógrafa que andava na recepção do andar.
“É o calor, Rebecca, nada demais.”
Tentei esboçar um sorriso.
“Tá combinando com sua camisa.” Ela riu.
Pelo menos a camisa rosa rendeu um comentário.
“Tá combinando com sua roupa também. Tá ótima.”
Ela olhou para sua blusa vermelha abotoada, sem mangas, que revelava braços levemente definidos. Abaixo, uma calça de trabalho bege e saltos baixos pretos.
“Obrigada. A gente tá direitinho, ein?”
“É verdade.”
O gerente de marketing apareceu na porta.
“Achei você. Tá ocupada?”
“Já vou, Cláudio!”
E ele sumia para dentro do andar.
“A gente vai se ver mais tarde, para suas fotos. Tem algum horário de preferência?”
“Tô livre o dia todo. Me encaixa onde for melhor para você.”
Achei que tinha notado um sorriso levemente provocador em seus lábios, mas talvez fosse esperança demais da minha parte.
“Tá bom, combinado. Vou falar com você mais tarde então.”
E seguimos para nosso trabalho.
Era um bom começo.

Tentei me distrair com o trabalho do dia.
Afinal, era apenas segunda-feira, e o fim de semana me deixou cheio de problemas para resolver.
Estava tão focado ouvindo “Lo-fi para trabalhar” em meus fones de ouvido que nem ouvi Rebecca chamando meu nome.
Também não vi sua mensagem no celular me convidando para almoçar com ela.
Comi na cantina do escritório, como sempre, com meu sanduíche natural e meu suco de laranja que trazia para o trabalho.
Na verdade, só percebi essas coisas quase no fim do expediente, quando metade do escritório já tinha ido embora.
Ainda estava de fone, mas dessa vez Rebecca deu-me dois toques no ombro, e foi aí que me virei e notei ela.
“Onde que você tava o dia todo?”
“Ahm… aqui.”
“Eu sei, bobo. Tava te esperando para marcar sua sessão de fotos.”
Levei a mão à testa.
“Puts… Esqueci completamente.”
“E você perdeu um almoço… De dar água na boca.”
Ela mordeu levemente os lábios, quase que inconsciente.
O que será que ela queria dizer com isso?
Antes que descobrisse, ela pegou em minha mão.
“Vamos, antes que o escritório desligue as luzes…”
“Ah- Para onde?”
“Tirar suas fotos, claro!”

Créditos: Gypsy Dog @gypsydognft

Havia algo diferente em Rebecca. Ela parecia mais solta.
Seus cabelos ondulados estavam menos arrumados.
Sua blusa estava com um botão a menos, revelando uma sombra de um sutiã branco. E sua calça, amarrotada.
Notei todos esses detalhes enquanto ela andava pelo escritório me levando ao Estúdio de Arte e Marketing, no final do corredor.
Rebecca não era uma pessoa super séria, e nem era uma daquelas que passam a camisa todo dia antes do trabalho. Mas, depois de tanto olhar para ela ao longo das semanas, eu naturalmente notava essas pequenas diferenças.
Como, por exemplo, as rasteirinhas cor-de-pele quase escondidas pela calça.
“Você trocou de sapato?”
Ela se virou, sorrindo.
“Você notou!”
Não sabia se era algo a se comemorar.
“Meu salto quebrou voltando do restaurante. Tive que comprar uma rasteirinha naquelas boutiques do lado.”
“Esse almoço foi agitado, ein?”
Ela enrubesceu.
“Você nem imagina.”
E entramos no Estúdio.
Só ia àquela sala praticamente duas vezes ao ano, e geralmente com a equipe inteira para as fotos da empresa.
Agora que a sala estava vazia, pude notar as paredes com revestimento acústico, as softboxes penduradas no teto, as lâmpadas portáteis encostadas no canto da sala.
Rebecca sumia por entre os acessórios largados na sala, as luzes acendiam.
E, no meio de tudo, por entre uma floresta de tripés e cabos, uma única cadeira rodeada de um fundo azul-cinzento de um céu claro repleto de nuvens.
“Sabe, sempre achei charmoso quando alguém nota o que estou vestindo.”
Rebecca abria uma case preta e montava sua câmera de trabalho.

“Você se veste bem. E eu gosto de elogiar algo que eu acho bonito.”
“Você me acha bonita?”
Um click enquanto ela encaixava a lente na câmera.
“Ahm… Claro.”
“Obrigada, mas hoje você que é o modelo, não eu. Senta lá, garanhão. Vai se acostumando com a cadeira.”
Sorri, e enquanto ela ajustava os toques finais em sua câmera, eu me aproximei do móvel, sentindo o metal em meus dedos.
Sentei.
“Ah”
“O quê? A cadeira te mordeu?”
“Tá fria, só.”
E começamos.
Ela me direcionava com algumas poses-padrão, “olhe para cá”, “agora olha pra mim”. Cruza as pernas, agora abre um pouco, relaxa os ombros, voce-tá-muito-sério. Isso, fica assim.
O clique das fotos recheava o silêncio da sala, e talvez até do escritório inteiro. Sentia uma leve tensão no ar, um misto de nervosismo e excitação.
Decidi arriscar.
“Você sempre faz isso?”
“Tirar fotos? É meu trabalho, né?”
“Quis dizer, ensaios.”
“Faço ensaios profissionais, de casal, empresários, artistas… Também trabalho com boudoir.”
“Boudo- Ahm?”
“Mostrar pras pessoas que elas podem se sentir bem com o próprio corpo. Que elas também são bonitas, e maravilhosas. Ajudar elas a se sentirem gostosas.”
Seus olhos brilhavam enquanto ela contava sobre seu trabalho. E era algo apaixonante de se ver.
“Quer ver uma coisa? Abre sua camisa.”
“Agora?”
Ela se aproximou, deixando a câmera pender em seu braço.
“Vou te mostrar o que quero dizer. Posso?”
Lentamente alcançou um botão da minha camisa, e o desfez com uma mão apenas.
“Agora você faz o resto.”
Assenti com a cabeça.
Abri minha camisa, expondo meu peitoral e barriga.
O frio da sala arrepiava minha pele.
Naquela hora desejei ter passado mais tempo na academia, e também mais tempo no banheiro para me depilar.
“Que fofinho. Agora relaxa os braços. Abre um pouco as pernas. E apoia seus cotovelos no joelho. Assim, isso.”
E mais um click.
“Agora fica de costas, de frente pra cadeira, isso.”
“Olha pra mim, por cima do ombro.”
Ela era linda mesmo. Cativante.
Mais um click.
“Pera…”
Aproximou-se novamente. Estremeci com seu toque em meu ombro, abaixando minha manga e revelando o começo de minhas costas.
“Lindo!”
Acho que estava apaixonado.
Um último clique.
“Pode vestir a camisa.”
Ela olhava para a tela digital de sua câmera enquanto eu refazer os botões.
“Hora da mágica.”

19 de junho de 2023

Créditos: Gypsy Dog @gypsydognft

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